Trecho do livro Histórias do além, de Rogério Corrêa:
Casebre mal-assombrado:
Na sede velha de uma fazenda em Minas Gerais já aconteceram muitas coisas estranhas.
O
finado Jair contou que testemunhou um dia em que algumas pessoas espíritas
desenterraram um pequeno tesouro perto
do velho casebre.
Aconteceram
muitas coisas estranhas naquela noite, viram dicoques[1]
do tamanho de uma bacia, um gato preto dos olhos vermelhos e do rabo muito
grosso, além do aparecimento de marimbondos.

Em outra ocasião chamaram uma mulher para “fazer o trabalho” de tentar retirar as assombrações do lugar. A mulher começou a falar coisas incompreensíveis, e andar com as mãos em lugar dos pés. Às vezes, andava apenas em uma das mãos dentro da casa. Foi um peteco só.
Já
era bem tarde da noite, e o Zé Raimundo e a esposa dele não queriam dormir no
local, então resolveram ir para Vazante.
No
entanto, as pessoas contratadas pediram para ninguém ir enquanto não
concluíssem todo o trabalho, caso contrário poderia acontecer alguma coisa no
caminho.
As
recomendações foram atendidas, aguardaram dentro do carro. Quando era de
madrugada, acordaram e avistaram um homem estranho passando próximo ao carro e
desaparecer em seguida. Isso não o impressionou, pois podia ser uma pessoa
qualquer passando por ali naquele horário. Porém, criou coragem de ir embora
para a cidade, mesmo correndo o perigo de o bicho jogar eles dentro de uma
ponte ou coisa parecida.
Não
aconteceu nada e também não resolveram o problema.
Novamente
trouxeram ajuda com outra pessoa do ramo, outra mulher. Ela chegou na fazenda
por volta de meio-dia. Pouco tempo depois ela disse que a coisa estava debaixo
de um pé de manga. Mal falou isso e
levou uma queda bruta que a virou de pés pra cima, ela se esborrachou no chão.
Ao
se levantar, a mulher estava com uma voz estranha e falando coisas esquisitas,
braba como uma onça raivosa, falando que iria pegar um da família. Nessa hora o
homem que acompanhava a mulher pediu para ajudá-lo a segurá-la. A mulher passou
a mão em um trancelim de ouro e o trancelim se despedaçou em muitos pedaços.
Continuava
espumando a boca e falando coisas do outro mundo, coisas que ninguém entendia.
O marido da mulher pediu ajuda. Ele era mais jovem, naquela época, tinha muita
força. Foi em direção à mulher e deu uma cacetada nas costas dela, com as
próprias mãos. Ele pensou que ela iria
cair de bruços devido à forte pancada, só que a coisa deu uma cambalhota e caiu
de costas, e continuou falando coisas estranhas.
Novamente
o marido da mulher pediu ajuda, no sentido de irem buscar outro cidadão também
dedicado ao mundo espiritual para ajudá-los a resolver o caso.
Zé
Raimundo não quis saber de ir buscar o outro homem na cidade, entregou as
chaves para ele e pediu que entregassem o carro no outro dia.
Pensou
que não receberia o carro inteiro. No outro dia entregaram o carro do mesmo
jeito que antes e foi informado que não deram conta de resolver o caso.
Se
antes não tinha medo, a partir daí começou a ficar com muito receio da coisa.
Por respeito ao proprietário da fazenda, apesar dos bons motivos para se mudar
de lá, sempre era convencido a não o fazer, porque se se mudasse, nenhuma outra
pessoa moraria lá.
Passados
alguns dias, acordou durante a noite e sentiu um grande arruaço e ouviu uma voz
grossa dentro do quarto escuro. Ele perguntou:
―
Quem está aí? O que você quer?
E
a coisa respondeu:
―
A partir de agora, é eu, ocê ou um túmulo.
Naquela
hora ele falou para a coisa que não queria nada de túmulo ou de coisa nenhuma,
só queria sair dali.
Chamou
a esposa, mas, ela não acordava de jeito nenhum. Depois de muita insistência,
conseguiu despertá-la. Contou o que tinha acontecido e informou que iam para a
cidade naquela hora (pouco mais de meia-noite). Era só o tempo de vestirem as
roupas e pegar uma lamparina[2] para levar até o carro.
Zé
Raimundo ficou com tanto medo que chegou a pensar que a coisa iria pegar eles
no caminho e cortar o farol do carro. Por isso, tinha de levar uma lamparina.
Entrou
no seu fusca e seguiu viagem muito preocupado e ainda assombrado. No caminho
não aconteceu nada, porém, quando entrou na cidade, perto onde é o atual Fórum
de Justiça, virou para à direita, na rua que atualmente fica a Delegacia de
Polícia Civil. A coisa deu uma chicotada no carro, na parte traseira, fez um
barulhão, parecia um tiro, de tão alto. Olhou pelo retrovisor e, dos lados, não
viu nada. Perdeu a coragem de parar na delegacia e acelerou. Ao chegar na
fazenda de seu patrão, não quis acordá-lo. Dormiram na casa próxima, onde a sua
mãe morava.
Quando
o dia amanheceu, o senhor José avistou o carro, e então foi cumprimentar seu
compadre.
―
Bom dia, compadre.
―
Bom dia.
―
O que aconteceu para estar aqui tão cedo? ― Ele perguntou.
Zé
Raimundo contou tudo ao patrão, o compadre senhor José, e informou que não
voltaria mais àquela casa.
Nessa
hora o senhor José colocou as mãos na cabeça e suplicou:
―
Meu compadre, pelo amor de Deus, não deixa a casa, porque se o senhor sair de
lá, outra pessoa não permanecerá na casa.
―
Compadre, dessa vez não tem volta, está decidido, não durmo lá nunca mais.
―
Não tem volta mesmo?
―
Não, compadre, eu lamento.
Zé
Virgílio ficou calado por algum tempo, depois falou:
―
O senhor vai ter que voltar lá agora para tirar o leite e levar sal para o
gado.
Senhor
José era muito sistemático, e por eles darem muito certo, resolveu fazer o
solicitado. Quando já estava perto da fazenda, em uma reta, uns cento e poucos
metros da casa, a coisa ruim pegou um dos lados do carro e levantou para o
alto, se levantasse mais um pouco ele virava. Ficou com tanto medo que só
lembrou de pedir proteção à Nossa Senhora, e, então, o cramulhão soltou o fusca
e deu aquele solavanco que quase o despedaçou.
Zé
Raimundo conta que olhou para os lados e não viu nada. Naquele momento ele se
tremia todo, e o medo era demais. A parte da estrada em que ele estava era um
lugar tão reto, e sem mais nem menos o trem fez aquilo com o carro!
Terminou
de chegar na casa, porém, não entrou dentro dela. Zé Raimundo estava meio
desorientado, parecia um tanto ruim da cabeça. Mesmo daquele jeito, tirou o
leite, fez os queijos, colocou sal nos cochos e retornou para a fazenda do
patrão.
Ficou
tão descabreado com aquele lugar assombrado, que acabou esquecendo até o
cachorro que ele mais gostava. Nos outros dias ele não retornou à fazenda, o
senhor José tinha arrumado outro peão para tirar o leite e fazer os queijos.
Passados
alguns dias, Zé Raimundo se lembrou de que tinha de voltar lá para buscar o
cachorro, caso contrário, o cachorro morreria de fome.
Dessa
vez foram a cavalo, levando um cachorro preto da irmã dele, o corta-ferro, e
mais dois homens.
Olharam
o gado, e, quando estavam passando perto do cemitério, veio um carro e
atropelou o cachorro corta-ferro. O bichinho morreu na hora. O meu cachorro foi
levado amarrado para não fugir.
Se
é ou não coincidência, Zé Raimundo disse que evita pensar naquilo.
Alguns
dias depois, voltou lá para mostrar a propriedade para o Baltazar, e o Baltazar
disse a ele:
―
Zé Raimundo você é mole demais, sô! Da
donde já se viu isso? Se aparecer algo aqui, irei amarrar ele pelo saco.
Zé
Raimundo desejou boa sorte, ao Baltazar, explicando que não teve coragem de
permanecer ali.
Poucos
dias depois de ele sair da casa, o Baltazar bebeu uma enorme quantidade de
veneno Furadan[3],
e de acordo com os conhecidos dele, fez até um buraco na cacunda.
Ficou-se
sabendo também, pela boca dos outros, que logo após o Baltazar ter bebido
veneno, foi em direção aos seus amigos e falou que tinha bebido uma coisa e ia
morrer, só que não queria morrer de jeito nenhum, mas, ia morrer de todo jeito.
E morreu de fato.
Zé
Raimundo acha que foram as bobeiras que o sujeito falou que provocaram a sua
morte.
Após
essa tragédia o senhor José convidou um padre para uma celebração na fazenda
assobrada. No dia da missa, além dos muitos convidados e familiares, estavam
presentes junto com eles um pai de santo de outra cidade, para resguardar o
padre, caso acontecesse algo com ele.
Apenas
senhor José e a esposa dele tinham conhecimento do fato. Depois do ato
ecumênico, nunca mais teve algo diferente na fazenda. Foram muitos os moradores
e nenhum deles reclamou de assombração.
[1] Sapo bem grande conhecido popularmente
como cururu.
[2] Lamparina é um objeto cônico de latão
onde se derrama querosene que molha um cordão que serve de pavio para colocar
fogo e iluminar o local. Lamparinas eram usadas principalmente onde não
possuiam energia elétrica. Atualmente são poucas as localidades que as usam.
[3] Furadan é um veneno fortíssimo e
perigoso. Inclusive existem vários relatos de pessoas perderem a vida após a
sua ingestão.
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